Entre os dias 25 e 29 de setembro de 2022, aconteceu a IV Edição da Conferência Indígena da Ayahuasca, no Instituto Yorenka Tasorentsin (IYT), espaço fundado pela liderança Ashaninka Benki Piyãko, em Marechal Thaumaturgo, no Acre.

Bu’ú Kennedy em sua palestra na IV Conferência da Ayahuasca

Essa foi a segunda vez que Bu’ú participou da conferência. A primeira vez foi na 3a Edição, que aconteceu ainda antes da pandemia, e quase todos os indígenas presentes eram do estado do Acre, apenas alguns de povos das fronteiras da Colômbia e do Peru. Bu’ú era o único indígena do território brasileiro de fora do estado do Acre que estava presente. Já na IV Edição, havia indígenas de outras localidades, assim como de outros países também. Do povo Tukano estavam presentes Bu’ú Kennedy, Daiara Tukano e Álvaro Tukano.

A Conferência Indígena da Ayahuasca é um evento de grande importância e de grande porte que tem custo alto que chega a alguns milhões de reais, uma vez que a organização custeia as passagens, fretamento de aviões da boca do Acre até Thaumaturgo, alimentação, transporte terrestre e hospedagem de todos os participantes convidados. Nesta edição, a maioria das financiadoras foram estrangeiras e os patrocinadores tiveram direito a estar presentes no encontro, porém não têm direito à palavra, os debates e lugares de fala são exclusividade dos povos nativos.

O foco da conferência é sobre o uso da Ayahuasca (que possui nomenclaturas diferentes em cada povo), como conduzir, quais os princípios e regras de uso, mas os debates acabam conectando a outros assuntos como proteção ambiental, questões culturais, entre outros, pois, segundo Bu’ú “quando estamos falando da ‘planta’, estamos falando da vida.”

Houve alguns confrontamentos nos debates sobre o uso da cannabis. Segundo Bu’ú Kennedy ela não entra dentro da linha do povo Yepá Mahsã (Tukano) desde os primeiros homens que beberam ayahuasca de sua ancestralidade: “posso dizer que 98% de nós somos contra o uso da cannabis”. Na opinião do Bu’ú, a cannabis é algo que muitos chamam de sagrado, mas compram na boca do tráfico e usam no dia a dia e, inclusive no círculo de cerimônia que conduzem. Assim, muitas pessoas ficam viciadas e acabam envolvidas com o tráfico e facções criminosas dentro do estado do Acre (por exemplo) e destruindo muitas famílias.”

Bu’ú foi um dos palestrantes convidados da IV Conferência e falou sobre as casas de origem, as casas sagradas e as casas cerimoniais, sua importância, como proteger, como cuidar e quais medicinas seus ancestrais receberam nos princípios: “a planta da ayahuasca, a planta do pé de tabaco, a planta do ipadu (coca), artefatos cerimoniais como as flautas de Jurupari que são usadas em iniciações, entre outros. Assim foram construídas as primeiras casas cerimoniais onde fizeram reeducação alimentar, dietas, para acessar conhecimentos e aprender. Por isso até hoje partilho a importância de regras, de reeducação alimentar antes e após a cerimônia para manter essa energia e aprender.”

Bu’ú contou que: “uma coisa boa e maravilhosa deste encontro, foi conhecer a força e firmeza que o amigo Davi Kopenawa – do povo Yanomami – tem de fazer dietas durante 30 dias sem comer e beber nada para usar a medicina do rapé e conectar com a natureza, com todos os seres e elementos para poder aprender com os seres invisíveis.”

Outro ponto citado por ele foi conhecer um grande mestre do povo Arhuaco, que foi iniciado em estudo onde ficou 20 anos morando em uma caverna, falaram de muitos mistérios e conversaram de assuntos como o mal uso da ayahuasca, quando acontece o que chamam de “espírito morto” e como ele perturba as pessoas, desalinha e alimenta o ego de condutores e participantes indisciplinados.

Claramente a Conferência Indígena da Ayahuasca é um evento de grande importância que precisa continuar acontecendo, pois promove partilhas e intercâmbios de conhecimento muito ricos entre os povos, assim como facilita sua união para se organizarem entre si, definirem objetivos em comum e formas de alcançá-los.

Bu’ú não tem críticas ao evento, disse que “a conferência é construída entre vários povos. É um conjunto, então tem que prosseguir e peneirar o que foi debatido de mais importante, se não não adianta nada. Por isso os redatores escreveram, para pontuar algo de concreto e aproveitar para a V Conferência.” Clique aqui para ler a Carta da IV Conferencia Indigena da Ayahuasca (1)

Ainda não há data marcada para a próxima Conferência, mas o local já está definido. Também foi dito que, no futuro, se houver algum nativo com espaço próprio e estrutura adequada, existe a possibilidade de sediar o evento em outras localidades.

Vale lembrar que o evento não é aberto para participantes que não sejam indígenas, as pessoas presentes de outras etnias eram maioria apoiadores, voluntários que se inscreveram para auxiliar no evento como médicos, auxílio logístico, registros audiovisuais e outros.

Añu! (gratidão)